Guardo com emoção um trecho do Auto da Compadecida, criação realmente imortal do poeta Ariano Suassuna, abordando as crendices, os hábitos e costumes nordestinos sob a ótica de uma dupla de personagens de inocência safada, anarquista e também desonesta, mas igualmente cativantes. Somente com muita maestria intelectual seria possível criar esse antagonismo de caráter em Chicó e João Grilo, os heróis do romance, os quais, de tão encantadores, foram perdoados, na fantasia do julgamento final pela mãe de Jesus.
Pois bem, na morte de João Grilo, o amigo Chicó assim se despediu: “Cumpriu sua sentença, encontrou-se com o único mal irremediável, aquilo que é a marca do nosso estranho destino sobre a terra; aquele fato sem explicação que iguala tudo o que é vivo em só rebanho, porque tudo o que é vivo, morre.”.
As palavras do Ariano reverberadas pelo seu personagem Chicó revelam-se perfeitas para o perdimento do autor, que se afasta calmamente da vida, sem o temor da morte, como costumava dizer.
A recente calma da serenidade madura alcançada contrastava com a inquietude cultural desse paraibano que influenciou a música, a dança, as artes plásticas, o teatro, o cinema e arquitetura, além de uma incursão em cargos de natureza política. Por força de sua genialidade, integrou 3 academias de letras: a paraibana, a pernambucana e a brasileira.
É muito difícil classificar o homem Ariano Suassuna dentro de uma classe cultural, uma vez que ele transitou em praticamente todas as atividades com que se defrontou ao longo da vida. Por essa razão é que fará tanta e dificilmente terá um substituto a altura, uma vez que gênios não são produzidos pela a ação do homem, do meio ou da escola. Eles apenas nascem.
A verdade é que a combinação funesta que vem emboscando a sabedoria nacional e abatendo alguns dos seus melhores cérebros acaba de arrebatar também um dos mais brilhantes brasileiros, de um Brasil sem brilho, no momento.
R.I.P., Ariano!
Por: Luiz Saul Pereira
Destaco como das mais importantes as publicações inteligentes do senhor Luiz Saul que são muito pontuais.
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