domingo, 29 de maio de 2016

"O CAVALO" - POR EDNALDO BEZERRA








Contava eu vinte e poucos anos, naquela época era forte, usava uma barba preta, cabelos escuros e bem cortados, um olhar altivo... No entanto, andava meio cabisbaixo, pois fazia duas semanas que acabara o namoro com Cristiane, uma moça bonita de cabelos castanhos, pele clara e bem carinhosa. Foi quando, numa quarta-feira chuvosa, a minha chefe me chamou para conversar: “Arthur, na semana que vem, você e a Lúcia irão fazer um curso sobre análise de projetos, alguma objeção?” Claro que adorei a ideia, pois, além do estudo desviar o foco dos meus pensamentos tristonhos, o curso possibilitar-me-ia fazer novas amizades, portanto, sem hesitar disse-lhe: “Que ótimo! É claro que não há nenhuma objeção, a senhora sabe: missão dada é missão cumprida”. Ela pegou a caneta, me olhou e meio que sorriu.

Na segunda-feira, acordei mais cedo do que o habitual, ansioso, fui à praia dar a minha caminhada diária. Não demorei muito a voltar. Cheguei a casa. Tomei um banho. Servi-me do café da manhã. Minutos depois, já estava na esquina de casa esperando a carona de Lúcia. Não sabia andar direito pelas bandas da Cidade Universitária, de modo que, no primeiro dia, pedi à minha amiga para ir com ela. O trânsito na Avenida Recife era bem menos intenso do que aquele que eu enfrentava diariamente indo ao centro da cidade, de modo que achei excelente o percurso, em cerca de meia hora já estávamos no local de treinamento.

A sala de aula não era muito grande, um pouco comprida, devia haver cerca de cinquenta bancas, um bureau na frente, um quadro verde e uma caixa de giz com apagador que lhe servia de tampa. Sentei-me numa banca na segunda coluna oposta à porta de entrada, na sexta fileira, quase no final da sala. De lá, observava as pessoas que iam chegando e as que já estavam sentadas. De repente, chegou uma moça que me chamou a atenção. Era uma negra muito bonita, feições delicadas, cabelos cacheados e cheios, um corpo magro e esguio. Usava uma roupa justa, calça jeans e camiseta branca. Seus olhos, bem pretos, luziam, pareciam falar. Torci para que ela se sentasse perto de mim, mas ela sentou-se em outro lugar, no meio da sala. Embora que, de onde eu estava, dava para avistá-la perfeitamente.

Eu era muito tímido, de maneira que não criei oportunidade de me aproximar da moça. Dela, sabia apenas que se chamava Moema e que era Zootecnista. Vivi durante todo o curso um amor platônico, sonhava com ela de noite, de manhã adorava ir às aulas só para vê-la, de fato, apaixonei-me. Acho que ela nem me notava, apenas uma vez me olhou com um olhar diferente, foi na ocasião em que apresentei um trabalho de classe. Cheguei até a pensar que ela poderia estar tendo uma queda por mim, porque li isto nos olhos dela, mas claro que era apenas ilusão de minha parte.

Porém, aquilo que é bom passa rápido, o curso estava terminando, iríamos, para concluir, fazer uma visita de campo nas indústrias de João Pessoa. Fomos todos de ônibus, era uma sexta-feira ensolarada, sentei-me ao lado da minha amiga, mas por sorte, a moça se sentou no banco ao lado. Usava uma saia rosa na altura do joelho, e, quando cruzava as pernas, como um ímã, meu olhar era atraído. Acho que ela notou...

Visitamos algumas indústrias, entre as quais uma fábrica de embutidos, depois disso, jurei que não mais comeria linguiças e salsichas. Tanto é que, após a visitação, os empresários ofereceram um coquetel com produtos da própria fábrica, mas não consegui comer nada, me restringi a tomar um suco de laranja (obviamente a promessa não durou muito. Pouco tempo depois voltei a comer embutidos).

Diferentemente da minha falta de apetite anterior, apreciei bastante a visita que fizermos à Cervejaria Antarctica, sobretudo os comes e bebes, regados à cerveja fresquinha e quitutes maravilhosos. Uma delícia! Pois bem, eu já havia bebido uns quatro copos de cerveja e conversava numa roda de amigos, aí eu comentei com um deles: “Pena, que não vai haver visita a empresas do setor rural...”. Uns quinze minutos depois, eu estava pegando um petisco, quando, inesperadamente, Moema me abordou: “Oi, Arthur! Vi que você queria visitar empresas rurais... Olha, amanhã irei a uma fazenda em Vitória de Santo Antão, se você quiser ir comigo... Acho que vai gostar! É uma fazenda de gado leiteiro de primeira linha, vacas holandesas com ótimas produtividades...”. Pensei que estivesse sonhando, e, obviamente, que, com prazer, fui conhecer a tal fazenda.

De fato, era uma propriedade rural belíssima, pastagens enormes, verdinhas, alamedas, córregos, instalações espaçosas e bem construídas. Um espetáculo! Fiquei entusiasmado com a qualidade e com a tecnologia empregada na produção de leite. O rebanho era formado por vacas holandesas. O corpo técnico registrava tudo, objetivava-se sempre a melhoramento genético do rebanho com vistas a maior produtividade, utilizava-se a inseminação artificial, tinha-se um cuidado especial com a consanguinidade e por aí vai. Particularmente, achei interessantíssimo o comportamento dos bezerrinhos, eles são iguais as crianças; num curral à parte, brincam e se divertem o tempo todo. Parecem meninos brincando de pega, correndo e pulando de um lado para o outro. É a vida! Dá gosto de ver.

No meio da tarde, eu e Moema fomos dar um passeio a pé pelos arvoredos, conversávamos assuntos técnicos e também banalidades. Um cavalo pastava placidamente por detrás de uma cerca, paramos e ela me perguntou se eu sabia cavalgar. Explicara-lhe que tinha medo, pois, quando criança, galopava num cavalo e, de repente, sem mais nem menos, ele parou jogando-me no chão. A minha sorte é que caí em terreno pantanoso, na verdade, na lama, e nada aconteceu. Só um arranhão no braço direito e o susto. Ela sorriu e disse-me que gostava de cavalgar. Neste instante, um outro equino se aproximou, uns cinquenta metros, o cavalo, assim que o avistou, teve uma ereção instantânea e saiu em disparada. Ela me disse que era uma égua que estava no cio e, por isso, o animal reagira daquele jeito. Ficamos ali vendo o cavalo cobrindo a sua fêmea. Meio constrangido, olhei para o rosto de Moema... havia algo diferente em seu olhar, a moça umedeceu os lábios e pegou na minha mão, deitamos ali mesmo na relva, embaixo de uma árvore frondosa...


Ednaldo Bezerra é escritor

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