O TCU E OS EMBARGOS INFRINGENTES - POR EDNALDO BEZERRA

O doutor Saraiva almoçava com várias pessoas, quando um contador, velho amigo seu, sentado à frente, comentou um artigo que lera na internet, intitulado “O que é verdadeiramente imoral”, e criticava duramente o TCU por este recomendar a paralisação de obras com indícios de irregularidade. Ele dizia:

– A população é quem perde, ao deixar de receber os benefícios de serviços que já foram pagos. Esses democratas do TCU... Pesquisem para ver quem está lá. Imoral!

O professor Saraiva, se sentindo incomodado, coçou a orelha esquerda e falou:

 – Quem disse que os serviços já foram pagos? Se fosse assim, então só precisaria exigir a conclusão das obras. Para que haveria mais desembolsos? Ora, como você sabe, o TCU é uma instituição brasileira prevista em nossa constituição e que tem atribuições específicas. E não é a primeira vez que o tribunal age desse modo, isso acontece. Afinal, ele tem essa missão mesmo, de fiscalizar.  E mais, pelo que sei, aquela Corte de Contas apenas recomenda que se deixe de enviar recursos para obras com indícios de irregularidades, mas quem decide é o Congresso Nacional. A democracia é assim. No entanto, parece que tem muita gente que acha que o Executivo deve ser o todo poderoso. Pelo visto, chegaremos lá, não é mesmo? É claro, atrás da Venezuela e da Argentina.

O doutor Saraiva bebeu um bom gole de cerveja e continuou: – Pois bem, o que não acho certo, meu amigo, são os discursos distorcidos que tentam jogar a opinião pública contra aquele órgão, como se ele estivesse errado por cumprir as suas atribuições, e quem praticou as supostas irregularidades fosse a vítima. As coisas parecem que estão bem invertidas, não acha? Coloque-se no lugar de um auditor, observe o lado técnico, e perceba a realidade dos fatos. Agora, o engraçado é que, na votação dos “embargos infringentes”, os defensores dos mensaleiros acharam que a decisão fora técnica; ou seja, naquele caso estava tudo certo, valia a técnica. O interessante, também, é que, enquanto os acórdãos do TCU sobre irregularidades são corriqueiros, os embargos infringentes são uma exceção, ou você já viu alguém mais ser contemplado com tal recurso? Se viu, cite-me um caso.
 – É... acho que eu não fui claro. Mas com a comparação da Venezuela e Argentina, eu desisto – argumentou o contador.

–Ora! Ora! A comparação é muito natural, porque o caminho que estamos seguindo é semelhante ao que aqueles países estão trilhando, ou será possível que você ainda não percebeu? Venha cá, você é marxista ou cristão? Sim, porque estas duas coisas são incompatíveis. Marx, por assim dizer, era um seguidor do capeta; dentre outras aberrações ele escreveu: “Evaporações infernais se levantam e enchem meu cérebro, até que eu enlouqueça e que meu coração não mude dramaticamente. Veem esta espada? O rei das trevas a vendeu a mim.”.

O contador ficou rubro e surpreso (como se, agora, tivesse que se decidir se seguiria Deus ou o diabo). O doutor Saraiva mexeu no celular e, depois de alguns segundos, disse-lhe:

–Bem, se você não acredita nos “raros” jornalistas que denunciam tal projeto Bolivariano... Há muito material na internet sobre o assunto, recomendo-lhe ver, inicialmente, pelo menos estes dois vídeos no “Youtube”, pesquise no “Google” o seguinte: “Lula e Dilma no Foro de São Paulo” e “Historiador é esculachado por Olavo de Carvalho”. Após assistir aos vídeos citados, talvez desperte uma dúvida em relação às suas verdades, e aí, quem sabe, você comece a enxergar as coisas de outro jeito. Não vou me alongar mais, e desculpe-me o desabafo, mas é que, como seu amigo, senti-me na obrigação de tentar-lhe abrir os olhos. Afinal, entre amigos a discussão é salutar.

Todos sentados à mesa começaram a rir, inclusive o contador e o professor, eles encheram os copos de cerveja e brindaram alegremente.

Ednaldo Bezerra é estudante de Licenciatura em Letras pela UFPE