domingo, 25 de fevereiro de 2018

CONTO: O ÚLTIMO SUSPIRO - ESCRITOR EDNALDO BEZERRA

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Numa manhã de fevereiro, quando recebi aquele telefonema, senti um frio na barriga, pressenti que Helen estava nas últimas...

Helen tinha a pele amendoada, cabelos pretos e lisos. Lembro-me de que na adolescência eu sonhara com ela várias vezes. Acordava no meio da noite, bebia um copo d’água e me deitava novamente, querendo que o sonho continuasse.

O tempo passou. Cada um tomou um rumo diferente. Fiz medicina, fui morar em Goiás. Lá, casei-me, tive filhos e netos. Depois voltei ao Recife. Agora, Helen estava ali na minha frente, no consultório. Pedia a minha opinião. Fora diagnosticada com um tumor no cérebro, e o cirurgião dissera-lhe que a operação seria bastante complicada. Havia apenas um por cento de chance de êxito. O que eu poderia dizer a minha amiga?

Tentei confortá-la, alimentar a fé e a esperança, afinal havia uma chance. Mas ela já estava decidida a não operar, queria apenas o meu apoio e que eu a tratasse em casa. Amenizasse as suas dores, quando ficassem mais intensas. Concordei. Creio que foi uma decisão acertada. Se fizesse a cirurgia, provavelmente ela morreria durante o procedimento. Assim, preferiu viver mais algum tempo, por menor que fosse.

A medicina, sem dúvida, alivia bastante o sofrimento do ser humano e evoluiu muito nos últimos tempos, alongando a vida de muita gente. Mas, por outro lado, tira do indivíduo a vivência do último instante de vida. Num hospital, quase sempre, os pacientes terminais vivem dopados, inconscientes, morrem sem poder usufruir a experiência da morte. Mas com Helen aconteceu diferente.

Por um milagre de Deus, o tumor evoluiu lentamente, e ela ainda sobreviveu quase oito anos. Naquela manhã de fevereiro, quando o telefone tocou, senti um frio na barriga, pressenti que Helen estava nas últimas. Cheguei a sua casa a tempo de vê-la com vida. A filha segurava-lhe a mão. Helen estava magra, abatida e um pouco ofegante, mas os olhos esverdeados eram os mesmos da juventude. Eles transmitiam tranquilidade, paz – um mar em calmaria. Foi assim que Helen deu o último suspiro.


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Ednaldo Bezerra - Escritor

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