Apesar
dos avanços trazidos pela legislação e ações para combater o
racismo, a discriminação sofrida pelos afrodescendentes no país
precisa ser combatida com mais medidas acredita o Grupo de Trabalho
das Nações Unidas sobre Afrodescendentes. A equipe esteve no Brasil
em dezembro do ano passado e avaliou diferentes aspectos relacionados
ao racismo existentes no país.
Educação,
cultura, violência, acesso à Justiça e emprego foram alguns dos
aspectos observados pelos integrantes da equipe, que se reuniu tanto
com autoridades como com a sociedade civil. Os resultados foram
apresentados em um relatório divulgado pela Organização das Nações
Unidas (ONU).
O
documento diz que o grupo de trabalho demonstrou preocupação com o
racismo “estrutural e institucional” existente no país. O censo
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), feito em
2010, mostra que os negros constituem a maioria da população
brasileira mas, de acordo com o levantamento feito pelos
representantes da ONU, eles sofrem com desigualdades em diferentes
aspectos, como maior taxa de desemprego (cerca de 50% maior) e menor
expectativa de vida: vivem seis anos a menos. Aproximadamente 52%
dessa população também não têm acesso a saneamento básico
adequado.
A
assessora internacional da Secretaria de Políticas de Promoção da
Igualdade Racial (Seppir), Magali Naves, diz que o governo brasileiro
reconhece o problema. Uma prova disso foi a criação da própria
secretaria, em 2003. “Isso é um avanço para se tratar dessas
questões e tem se tentado adotar medidas para inverter a situação.
Por isso as quotas na educação, no serviço público, a
implementação da Política Nacional de Saúde Integral da População
Negra, a criação do Plano Juventude Viva, que é contra o
assassinato de jovens negros, além de outras ações. Isso é um
processo”.
Os
especialistas destacaram diferentes medidas positivas adotadas nos
últimos dez anos para melhoria da situação, ainda assim, o
documento alega que, mesmo com essas medidas, a discriminação está
em todas as áreas da vida e que a população negra tem tido
dificuldades para debater o tema no país.
Na
área da educação foram encontrados os maiores indícios de
desigualdades de discriminação e é apontada como essencial para
alterar as representações e esteriótipos da sociedade. “Por isso
se tem uma assistência da gestão atual de trabalhar com ações
afirmativas visando a ter mudanças. Tivemos melhorias na educação,
mercado de trabalho, renda, mas ainda continua uma desigualdade
profunda. Você tem que pegar a questão histórica de como foi
formado o Brasil e ver que isso é um processo” explica a assessora
da Seppir.
Além
de apontar os problemas analisados, o documento traz também
recomendações para os órgão de combate ao racismo no Brasil. Na
área educacional, o documento elogia a criação das cotas e a
decisão do Supremo Tribunal Federal pela constitucionalidade do
sistema e afirma que este foi um passo importante para garantir o
acesso da população negra ao ensino superior. Segundo o relatório,
novas medidas devem ser adotadas para que esses estudantes permaneçam
estudando nas instituições de ensino superior do país.
Outro
destaque foi a criação da lei que prevê a inclusão obrigatória
da história e cultura afro-brasileira nas escolas de ensino
fundamental e médio. Magali Naves conta que a legislação foi
criada em 2003 e é uma forma de mudar a visão dos estudantes. “A
gente não surgiu escravo. Isso tem uma história antes e depois. A
partir do momento em que você conhece o outro, a situação fica
mais clara.
A implementação dessa lei, com certeza, ajuda a
população a se conhecer e conhecer a sua história e a gente está
trabalhando exatamente nesse sentido”. A ONU recomenda o
investimento no treinamento de professores para que a norma seja
implantada cada vez mais e que os currículos escolares devem ser
melhorados para garantir que o aluno tenha conhecimento sobre a
história africana.
A
aplicação da Lei do Racismo, a melhoria das estruturas estaduais e
municipais para o combate à discriminação e a adoção de
políticas de prevenção da violência, especialmente contra as
mulheres e crianças também foram pontos abordados. A atuação da
polícia também foi citada. Para os membros do grupo de trabalho, a
corporação precisa de treinamento e sensibilização para mudar a
cultura de violência que muitas vezes é usada como pretexto para a
segurança nacional.
Magali
Naves acredita que o relatório aponta questões no sentido de
orientar o aprofundamento do trabalho que vem sendo desenvolvido pela
secretaria. “É um pouco da continuidade do que estamos fazendo.
Aprofundar mais e ser mais célere. Isso nos ajuda, de uma certa
maneira, porque você tem uma visão de fora sobre uma atuação que
a gente já está trabalhando, mas que agora você tem
recomendações”.
Magali
destaca que muitos dos pontos levantados são de preocupação da
Seppir, como o caso da violência contra os jovens negros, por
exemplo, e destaca que a secretaria trabalha em diferentes áreas e
com outros ministérios para que políticas de inclusão sejam
adotadas. “Eu acho que [o relatório] reforça a necessidade de
políticas que são importantes e não são importantes somente para
a população negra. São importantes para o Brasil. Um país onde as
oportunidades são iguais, é mais criativo, igualitário, vive mais
em paz. É importante para o país como um todo”.
Fonte: Michèlle Canes/Repórter da Agência Brasil
Edição: Fábio Massalli
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